Amores


                                                            
  Outro dia numa conversa com uma amiga, nos questionávamos sobre quantos grandes amores vivemos ao longo de uma vida.
  Muito se comenta sobre o grande amor da nossa vida. É como se esse fosse único, inesquecível, realmente especial. Mas vamos analisar, apenas com a lógica.
  Tire a visão romântica da sala e vamos lá : Ali na infância, por volta dos 6,7 anos, encontramos aquele amiguinho lindo que confidenciamos a nossa melhor amiga que aquele é nosso namorado. Dividimos o lanche, sentamos juntos no recreio, ele me ensina a colorir bem certinho, eu ensino a recortar os detalhes das figuras. Mas ele nunca soube que nós namorávamos é claro.
  Depois vamos caminhando para adolescência e ali, nos 15 anos mais ou menos, encontramos outro amor! Ah, o amor dos 15 anos! É intenso, vira nossos dias de pernas pro ar, acaba com nossas noites de sono, prejudica nossas notas no colégio, nos faz descobrir que uma espinha pode ser o grande desafio da vida. Aos 15 anos amamos com uma força avassaladora, enfrentamos o mundo, queremos seguir juntos, afinal este amor é para sempre!
  Mas se aos 15 anos nos sobra emoções tempestivas, nos falta maturidade, discernimento. Precisamos de autorização para viver esse grande amor. Então ele fica pelo caminho.
  Amadurecemos e num tempo bem próximo, encontramos outro amor. Agora sim, já iniciamos nossa vida profissional, já caminhamos no mundo adulto, vislumbramos um futuro. E queremos construí-lo juntos, pensamos em casamento, analisamos o orçamento, imaginamos a cerimônia, os filhos. Já estamos na casa dos 25, 27 anos. Podemos transformar esse amor, no nosso grande amor! E alguns com certeza farão isso, seguirão para o altar.
  Mas aquela viagem, aquela especialização no exterior, aquele desejo do próprio negócio, da casa própria, da vida própria, fará que outros abandonem mais este amor no trajeto.
  Seguimos e quando nos aproximamos dos 35, 37 anos, provavelmente encontraremos outro amor. Este será o amor da urgência. Já estamos estabilizados profissionalmente, compramos carro, casa, temos cartão de credito e cheque especial. Já fizemos pós, mestrado e o mais grave, nossas amigas estão todas (ou quase) casadas ! E tem nosso corpo, é claro, nosso relógio biológico está gritando, queremos reproduzir, precisamos de uma testemunha para o que realizamos.
  Talvez este amor nem seja assim tão especial, nem tão doce como foi aquele que ficou perdido nos 15 anos, mas já estamos meio sem tempo, melhor então não arriscar!
  Para alguns este será o primeiro grande amor, a primeira aliança, mas na contramão, este amor da urgência pode ser o segundo grande amor.
  Claro, houveram aqueles que transformaram o amor anterior, aquele dos 25, 27 anos, no seu grande amor, o levaram pro altar, mas depois acabaram percebendo que não era assim tão grande amor, faltava alguma coisinha. Mas este novo amor, agora bem mais maduro, com certeza será o "grande amor de nossa vida".
  Este sim, é um amor maduro, seguro. consciente.
  Mas pode ser perigoso. E para as duas situações.
  Quem está descobrindo seu grande amor pela 1ª vez, está movido pela urgência biológica, lembra? E quem está descobrindo seu grande amor pela 2ª vez, está é correndo da besteira que fez quando provavelmente casou com o 3ª amor.
  Mas vamos seguindo.
  Alguns  encerram então sua trajetória de amores. Casaram-se com os 4ª amor, seja por urgência biológica, ou por arrependimento tardio, o motivo pouco importa.
  O que importa é que nesta idade, já nos aproximando dos 40 anos, o melhor é acreditar plenamente que este seja nosso grande amor. Que diferença faz se foi a urgência biológica, ou a burrice, que o transformou nisso?
  Mas, quando achávamos que ficaríamos quietinhas, que finalmente estávamos vivendo nosso grande amor, percebemos que ele já não nos ensina mais nada, como nosso amor dos 7 anos,...não leva nosso coração a boca quando nos beija, como nosso amor dos 15 anos,..não passamos horas discutindo qual filme assistir no cinema como era aos 25 anos,..e nem temos mais a urgência do sexo que tivemos aos 37 anos,...
  E de repente observamos que nosso grande amor se transformou em ternura, carinho, ficou morninho !
  Porém a esta altura, muito provavelmente já alcançamos os 48, 50 anos, nossa situação já está estabilizada, temos uma família sólida,  viajamos em férias 1 vez por ano, trocamos de carro todo mês de janeiro, os amigos nos consideram um grande casal! O melhor a fazer é continuar ali, fazendo parte da mobília.
E é ai que podemos ser surpreendidos.
  Atropeladas por outro amor! Nosso grande amor, este é nosso grande amor. Temos tempo para analisa-lo devagarzinho, não temos mais que pedir autorização, não temos mais uma especialização para fazer, nosso relógio biológico já se acalmou, nosso filhos já estão na faculdade, nosso tempo é mais nosso agora!
  Entre medo, susto, surpresa, vamos nos deliciando com aquela pessoa, que se mostra sem pressa, que olhamos sem pressa. Ele vai chegando devagarzinho, se instalando nos nossos dias e quando percebemos a confusão esta armada!
  O mundo ganha a cor dos 7 anos, a força dos 15, a disposição dos 25, a maturidade dos 37. E a paixão que acompanha, tem a força de toda uma vida, a segurança de uma história que já esta escrita e que pensávamos ousadamente já saber o final.
  Alguns terão a ousadia da juventude e irão recomeçar.
  Pedir perdão, se justificar, enxugar algumas lágrimas, mas seguirão decididos a viver finalmente o grande amor.
  Enquanto outros talvez até se permitam viver o grande amor clandestinamente, por um tempo com data marcada para acabar, apenas para não terem a sensação da covardia plena, mas depois o deixarão pelo caminho. Vão escolher manter a mobília intacta, onde sempre esteve.
  Para estes o grande amor terá se atrasado demais. E deixará apenas o gosto do querer mais, a dúvida, o não saber o que poderia ter sido.

  Não me lembro mais com certeza quando escrevi este texto, nem sempre tenho o cuidado de data-las, alias, isto é algo que preciso aprender a fazer, gosto de revisitar minhas ideias de tempos em tempos e sem saber que tempo foi esse, fica difícil..rsrs..
Mas independente de que tempo tenha sido este, ainda penso assim, vejo mais ou menos assim a "lista de amores",...Não sei se para todos, se para mim,..Mas também não tenho a pretensão de saber!

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