Eu, minha ansiedade e nosso novo amigo

  Sempre me orgulhei por conseguir me manter firme na minha disposição a abstinência química! Em tempos onde a felicidade se apresenta em vidros, o sucesso em livros e a disposição em shakes, consegui atravessar 41 anos sem recorrer a nada para dormir, nem para acordar, muito menos para esquecer.
  Sofri todas as dores e lágrimas que me foram permitidas e exigidas sem um único comprimido! Mas tive finalmente que me render a eles, reconhecer que era hora de pedir auxílio extra.
  Os últimos 5, talvez 6 anos foram dose e dose para leão nenhum reclamar! Tive direito a tudo o que nunca pensei querer, abri a temporada com uma mega crise de minha filha em pleno 15 anos de idade, onde se instalou na minha casa o que eu chamava carinhosamente de Faixa de Gaza! Finais de semana viraram um teste de resistência, eu tinha que me desdobrar entre filha e marido que passaram longos 2 anos sem se falar. Os efeitos  se acumularam, se misturaram, se intensificaram! 
  O casamento foi pagando um alto preço por isso claro, já vinha desgastado por uma série de outras questões e apenas teve seu estado piorado! A saúde não deixou por menos, e também correu atrás, me dando algumas rasteiras. Uma cirurgia programada, outra sequencial inesperada e assustada, período de recuperação, decepção na área profissional, gente nova se mostrando, coragem nova surgindo em meio ao semi caos e o recomeço! Quase na integra, quase inteira!
  Mas acho que não me dei o tempo para o oxigênio, aquela ida a tona tão necessária nos momentos onde nos falta o ar, fui apenas fazendo, planejando, deixando acontecer, atropelando e sendo atropelada!
  O corpo começou sussurando, eu fui fingindo não ouvir e quando percebi já tinha conquistado o direito a 2 hérnias discais, uma enxaqueca super fiel e leal e um humor modelo montanha russa! Acordo querendo dominar o mundo e encerro o dia querendo ser tatu!
  Conselhos aparecem de todos os lados, alguns doces, carinhosos, outros puxões de orelha mesmo e dos grandes! Ouço a toda hora o que passei a vida entoando: faça atividade física, se alimente adequadamente, tenha religiosidade, exercite a paciência, a boa vontade, compreenda que tudo tem seu tempo!
  Difícil evitar querer colocar para correr todo samaritano que me surge a frente!
  Me rendi e agendei uma consulta médica! A idéia inicial era apenas um checkup básico, para tentar iniciar uma atividade física.
  A consulta já se mostrou uma surpresa! Agendei um clínico geral que depois descobri ser também geriatra e logo na sequencia descobri que geriatras não tem que ser também velhinhos! Grande engano! Entro no consultório e me deparo com um homem, bonito demais para me deixar a vontade, foi meu primeiro pensamento! Mas já estava ali, se tentasse correr poderia pegar mal! Melhor relaxar!
  Terceira surpresa, uma consulta no sentido mais real da palavra, me perguntou sobre religião, hábitos, me olhava nos olhos, coisa tão rara nos médicos atualmente! Exame clínico feito, perguntas respondidas e eis que ele se senta e como quem vai me pedir algo, me pergunta o que eu acho de tomar um remédio para ansiedade! Fui traída pelas minhas unhas!Voltei a roe-las e segundo ele, este foi o grande sinal de que minha ansiedade estava me tirando o eixo!
  Pode parecer estranho para a maioria das mulheres que recorrem a ansiolítico com uma facilidade imensa, mas gastei os próximos minutos analisando, pensando naquela proposta que me soava meio indecente! Eu tomando remédio para ansiedade?
  Fui tomada primeiro pela culpa, culpa por não estar conseguindo administrar meus conflitos e justo eu, que conhecia todos os caminhos para isso, e depois pelo medo, medo não pânico, pânico de me tornar dependente de um medicamento, de a abrir uma porta que não conseguiria mais fechar onde para me sentir feliz teria que recorrer a uma cartelinha!
  Mas ao mesmo tempo, sempre reconheci que há um momento certo para tudo na vida, e que negar isso é irracional! E tenho que reconhecer no meu momento, que embora eu saiba que procurar o caminho de resolver as causas é sempre melhor que sanar os sintomas, creio que não estou preparada para isso!
  Melhor tentar, acreditar e me permitir finalmente entrar para o mundo das ansiosas devidamente medicadas!
  

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